De Palavras e Sonhos

domingo, novembro 13, 2005

Um novo sol para mim (3 de 4)

Estava tudo a correr tão bem. Sentia uma felicidade tão grande… nunca tinha sentido isso antes.
E depois ficou tudo escuro outra vez.
Quando vi outra vez uma luz a sair do meu lado pensei que o sonho se estava a repetir: aquele ponto de luz fez-se novamente em criança; ela mexia-se como a outra e tudo.
Mas quando o preto desapareceu outra vez não havia berço à minha frente, mas uma mulher deitada numa cama. Eu conhecia-a. Olhei, olhei e foi ai que me lembrei: era a noiva daquele rapaz.
Vi-a a acordar com um sorriso. À frente dela estava esse rapaz com uma criança ao seu lado e outra ao colo. Ele disse-lhe qualquer coisa e depois poisou o bebé que tinha nos braços, no colo dela. O pequeno que estava ao lado do pai pôs-se logo ao lado da mãe para brincar com o bebé. O pai a sorrir, virou-se para ele e disse-lhe: “Olha, agora já tens uma mana para brincares.”
- Ainda houve mais?
- Houve. E foi a melhor parte.
Depois daquela cena no quarto muitas mais crianças apareceram, e eles estavam já bem mais velhos. Estavam eles, e acho que quatro crianças e dois casais… eram de certeza os dois irmãos.
Devias ter visto aquela casa… quem me dera que a minha família fosse assim: mal se abrem uns com os outros, quanto mais sorrisos sinceros.
O sonho estava a correr tão bem nesse momento…mas as imagens que eu vi começaram todas a recuar – algo que só ia perceber mesmo mais à frente. Foi uma coisa estranha ver uma vida a recuar tão depressa.
Estava outra vez sentada no banco, somente com aquele homem ao meu lado. Antes que eu tentasse ganhar forças para me voltar para ele, pegou-me na mão e levou-me para cima de uma nuvem.
Sentamo-nos e ele perguntou-me se sabia de quem era aquela criança. Disse-lhe que não, que não sabia e ai disse-me que ia já perceber.
Quando me perguntou porque é que queria fazer um aborto fiquei a olhar para ele sem saber como é que ele sabia e sem saber o que dizer até. Disse-lhe que não tínhamos dinheiro para cuidar de uma criança, nem estávamos preparados para lidar com essa situação. Mas acho que ele já sabia o que eu pensava porque começou a sorrir e disse-me:
- Não tenhas medo de levar a gravidez até ao fim, eu vou estar sempre do teu lado quando precisares.
Sabes, sempre que uma pessoa tira a vida a um filho meu quebra-me o coração. Tirar a vida a um ser humano, seja no primeiro de sua vida, seja no último, por qualquer razão que seja, é negar aquilo de que vos fiz, percebes?
Vocês são amor: vocês são em mim e eu em vocês.
Se decidires tirar essa vida de dentro de ti vais estar a negar-me, a negar-te a ti própria, como também a todos aqueles que amas e te amam. No fundo vais por de lado tudo o que existe em mim e tudo o que sai de mim.
Deixa-me dar-lhe vida. Eu amo-o muito, e ele vai ser muito importante para mim, tanto como tu és.
Aceita-me e vais perceber aquilo para que nasceste, chega de sofrimento sem necessidade. Quem sabe se aquela criança que tu viste não será o elo de ligação da tua família.”Depois calou-se, e estendendo a mão fez nascer outra centelha de luz. Mas desta vez, em vez de a soprar para longe de mim, bufou-a na minha direcção fazendo-a entrar no meu corpo.
Délio Melo domingo, novembro 13, 2005

3 Comments:

ESTÁ ESPETACULAR O TRECHO E SEM DÚVIDA UM TEMA MAIS Q ACTUAL!!!

CONTINUA ASSIM E S PUDERES OUVE A MUSICA "SO FORTUNATE" DOS ADEMA.TEM UMA SEMELHANCA C A PARTE EM Q O PAI TINHA O FILHO AO COLO!
O texto chegou hoje ao fim.
Tudo é detalhe
nas letras traçadas
na ponta da lança.
O poente



as rimas migrantes,
nas estrofes da lida.
nos versos, o entalhe
febril da vida.

Parabens!!!

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