De Palavras e Sonhos

sexta-feira, março 10, 2006

Eclipse lunar

De muito longe continuam a vir réplicas de um terramoto que começou há quase cinquenta – e não me parece que parem tão cedo.
É natural havê-los durante uma vida inteira – como quem diz –, mas não é normal continuarem ano após ano.
Às vezes penso que pararam…mas quando me lembro deles vejo que eram uma ilusão: os momentos de silêncio e paz eram apenas eu a fechar os olhos para descansar.
Demorei anos a perceber de onde vinha tanta força e do que estava realmente a acontecer: não era um terramoto, era um eclipse que fazia tremer o mundo.

Atravessando terras, tempestades de areia, culturas e mares, cheguei a um vale.
O eclipse, aqui, cobria plenamente a terra. A luz, exígua, não chegava para ver com claridade, quanto mais fazer crescer algo.
No vale estavam duas nações, uma para cada lado…e ambas gritavam blasfémias e promessas de ódio de parte a parte.
É estranho, mas, todas as vozes soavam ao mesmo. Tinham um tom malévolo e inumano. Só o som das mesmas chegava para me arrepiar a espinha.
Com pedras e paus nas mãos, o que me assustava era o olhar daquelas pessoas. Havia neles um brilho de maldade como nunca tinha visto, quase...Eu conseguia ver que algo dentro delas fervia algo.
Desde que cheguei que não conseguia parar de tremer. Era por causa daquele local, sabia-o. Palavras de ódio, gestos abomináveis e um céu negro batiam-me com tanta força que sentia o peito a apertar, lentamente, cada vez mais.

Por entre eles passava muito rapidamente uma sombra. Colocando-se por detrás de cada um deles, sussurrava-lhes algo que, de onde estava, não conseguia ouvir. E saltando de um lado para o outro, falando com cada uma daquelas pessoas, tornava-as mais e mais violentas.
Fechei os olhos, já não aguentava mais olhar para eles e foi ai que ouvi…
Com os olhos fechados pude ouvir que para além de gritos, cada um deles pedia, com pouco fôlego, por ajuda.
Surpreso, sem saber de onde vinham aquelas vozes, abri os olhos…para encontrar um campo de gente moribundo, com uma luz que era aspirada pela sombra.
Aquele ódio todo…aquela falsa vitalidade…era oca. Aquilo estava a consumi-los sem se aperceberem. Crescendo com a sua queda, tornando-se mais forte.
Délio Melo sexta-feira, março 10, 2006

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