De Palavras e Sonhos

quinta-feira, dezembro 13, 2007

Três céus - VI

Ele:

Eram 10 horas e ela ainda não tinha chegado. Será que tinha ficado a dormir? “Bem, ela tem aquele lado dorminhoco nela” – pensei.
Ainda pensei em telefonar-lhe mas se ela realmente estava a dormir, não seria eu que a iria acordar. Fiquei de lhe ligar um pouco mais tarde mas acabei-me por distrair e já eram horas de ir embora.

Acabei, foi, por ficar preocupado. Ela não tinha dito nada no dia anterior, e ela até costumava dizer sempre para lhe guardar um lugar para ela junto de mim… ainda por cima ela estava sozinha em casa.
Quando cheguei a casa, a primeira coisa que fiz foi telefonar-lhe logo. Demorou um bocado a atender o telefone e quando o fez veio cá com uma voz…
Ficou tão cansada com a noitada de ontem que ao chegar a casa nem trocou de roupa, nem fechou a janela que tinha deixado aberta desde manhã. E depois pimba: tinha ficado com o pingo no nariz e dores de garganta. “És mesmo tola” – disse-lhe.
Mas como eu era bom rapaz perguntei-lhe onde morava e de tarde fui lá para não a deixar sozinha. Já basta estar doente, ainda por cima estar só…

Morava num condomínio, no rés-do-chão, não muito longe da praia. Por acaso era um sítio muito bonito e com muitos espaços verdes.
Toquei à campainha e veio ela de t-shirt e calções abrir-me a porta. Acho que quando a vi quem se começou a sentir mal fui eu…
Levou-me para o quarto dela e sentamo-nos em cima da cama dela. Ela meteu-se debaixo do lençol e começou-me a contar a noite do dia anterior.
Depois de ouvir aquilo tudo até me custava a acreditar como é que ela tinha saído tão diferente das amigas. Elas muito extrovertidas e esta rapariga o oposto – para dizer a verdade, ainda bem!

Tive que a mandar calar para a fazer descansar um bocado.
Assim que fechou os olhos comecei-lhe a passar a mão pelo cabelo e pela cabeça, a fazer festinhas e passado nem cinco minutos já ela estava praticamente a dormir. Só que quando me levantei para ir fechar a persiana (que estava a deixar entrar muita luz) ela abriu os olhos e perguntou-me se já ia embora. “Não. Só ia baixar a persiana para a luz não te dar nos olhos.” – Disse-lhe enquanto baixava levemente a persiana.
Perguntou-me então se queria ficar mais um bocado com ela, e mesmo que adormecesse para não ir.
Não consegui deixar de sorrir por dentro; eu queria ouvir aquilo!
Fechei a persiana e fui-me deitar ao lado dela.
Ainda dentro do lençol, encostou-se a mim e pediu-me para continuar a mexer-lhe na cabeça. E assim fiz: continuei a mexer-lhe até ver que tinha adormecido, depois cheguei um bocado para o lado e pronto, fechei os olhos.

Ela era tão bonita a dormir…

Mais tarde, não sei quanto tempo depois, acordei. Ela estava completamente encostada a mim, com a cara a centímetros da minha.
Não posso negar que isso não me foi indiferente, porque não foi. Pensei em acorda-la ou afastar-me mas… era bom de mais.
Fiquei assim até ela acordar.
Passado um bocado começou a abrir os olhos devagar e a esticar-se. Virou-se de barriga para cima e bocejou. De repente virou-se para a esquerda e deu novamente de caras comigo. Abriu os olhos num instante… acho que não estava à espera de me ver tão perto.
Nos primeiros segundos, olhei para ela fixamente com apenas uma coisa na cabeça. Mas por uma mistura de medo e vergonha recuei.
“Boa tarde dorminhoca” – falei-lhe baixinho. E ela sorriu da maneira mais bonita que eu alguma vez tinha visto.

Aquela imagem ficou comigo durante muitos dias.
Ela:

O dia começou mesmo mal: cheia de vontade de sair de casa e um nariz a pingar, a fechar-me em casa.
Não havia mais nada a fazer a não ser ver televisão e mandar mensagens pelo telemóvel (foi a única coisa que me entreteve durante a manhã).
Às vezes ainda me levantava e ia à varanda ver as pessoas a passarem. Sentava-me numa cadeira de praia e ficava ali um bocado, pelo menos até o vento me começar a incomodar – não me apetecia ficar pior. Depois, lá ia de novo para a cama no meu quarto e ficava ali a ver televisão.

Quando estava a acabar de lavar a louça do almoço o telefone tocou.
Era ele que me estava a ligar – tinha ficado preocupado comigo! Perguntou-me se podia passar por minha casa depois de almoçar. É claro que a resposta foi sim.
Arrumei o resto da cozinha e o meu quarto, que estava a ficar com roupa demais por detrás da porta.

Já estava a ficar ansiosa. Não sabia se devia preparar já alguma coisa para o lanche ou se deveria ir comprar alguma coisa.
Quando já me tinha vestido para ir buscar algo num instante à loja, toca ele à porta.
Mostrei-lhe a casa e depois fomo-nos sentar para o meu quarto.

Uma das coisas que me disse logo foi se precisava que fosse buscar alguma coisa – só pelo prazer de o ver a ser tão querido quase que aceitava.
Contei-lhe como tinha corrido a noite anterior e porque é que tinha chegado a casa totalmente partida. Ainda deu para nos rirmos um bocado!
Depois mandou-me deitar e descansar. Deitei-me e ele começou-me a passar a mão pela cabeça.
Cá dentro saiu um grande “aahhhhh”. Aquilo estava-me a saber tão bem que comecei a ficar mesmo com os olhos pesados.
Estava mesmo a adormecer quando me apercebi de que se estava a levantar. Sem pensar agarrei-lhe o pulso: “Vais embora?” - perguntei-lhe. Mas não, só ia baixar a persiana para que eu dormisse melhor.
Eu não queria que ele fosse embora, queria ficar com ele mais um bocadinho… Por isso perguntei-lhe se não queria ficar, mesmo se adormecesse. Sorriu-me e deitou-se ao meu lado e deu-me mais miminhos (Woo-hoo!).

Meti-me por baixo do lençol e encostei-me a ele. “Continua a passar-me a mão pela cabeça.” – Pedi-lhe, meio envergonhada.
Com aqueles carinhos todos acabei por adormecer num instante.

Ao acordar não me podia ter acontecido coisa pior… ou será melhor?
Como é meu hábito, assim que acordei espreguicei-me toda. O pior é que quando me virei para o lado esquerdo fiquei com a minha cara praticamente colada à dele.
Ao início até fiquei sem saber como reagir – e só sentia o meu coração a acordar mais depressa que o resto do corpo.
Nunca o tinha olhado tão profundamente. O olhar dele fazia-me ficar quieta, mesmo sem vontade de me mexer.
Quantos mais segundos se passavam, mais clara era uma crescente intenção em mim. Só me queria aproximar mais dele para…
…“ Boa tarde dorminhoca” – disse-me, mostrando um doce sorriso.

Durante o resto do dia, aqueles poucos segundos repetiram-se vezes sem conta dentro de mim.Já sentia o meu coração diferente…
Délio Melo quinta-feira, dezembro 13, 2007

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