De Palavras e Sonhos

quarta-feira, agosto 29, 2007

No reflexo, um mundo original

Há muito tempo atrás, num lugar distante, havia uma pequena casa. Ao seu redor não havia uma única flor, uma única pessoa ou o mais pequeno barulho. Nada existia ali.
Um dia, o fumo que saia já fraco da chaminé deixou de sair e o Homem que lá vivia, sentindo pela primeira vez frio na pele arrepiada e nos ossos, perguntou-se “Aonde estão as flores do meu campo, as pessoas que por aqui passaram e as palavras do mundo?”

O mundo tinha parado. Dentro dele apenas restava aquela pergunta, a que ele não conseguiu responder, mesmo ouvindo vezes e vezes sem conta, dentro de si, a pergunta que antes tinha feito.
“Mas o que é que me aconteceu?” – interrogou-se novamente.
Então uma grande ventania surgiu no horizonte e com uma imensa força arrancou o telhado, levando-o para muito longe.
Sem telhado, o frágil corpo daquele velhinho arrepiava-se cada vez mais e todo o seu corpo doía por causa do frio.
“Eu tenho tanto frio. Se ao menos tivesse um cobertor para me tapar o corpo!” – exclamou para fora.
Uma segunda rajada de vento, ainda mais forte que a primeira, destruiu as paredes e levou consigo todos os destroços tirando àquele Homem novo refúgio.

Sem telhado e sem paredes que o protegessem do frio, o Homem aninhou-se e cobrindo os joelhos com os braços, procurou em vão aquecer-se a si mesmo. Mas o tempo passava e cada vez mais sentia fraqueza. Pensamentos de morte percorriam-lhe a mente.
“Ajudem-me!” – gritava ele em busca de um salvador. E cada vez mais alto lhe saiam da boca os gritos: “Por favor, alguém!”
Ainda aninhado, calado pelo fracasso e silêncio, fixando o chão, já conseguia ouvir um decrescente bater do seu coração. “Eu vou morrer…” – pensava, com as lágrimas a correrem o rosto, uma atrás da outra.

Uma enorme poça de choro começou-se a formar por debaixo daquele Homem que não parava de chorar. E foi ai que ele reparou que no reflexo que a água trazia, ao contrário do que ele conseguia ver no seu mundo, habitavam todas aquelas flores, pessoas e palavras que ele outrora conheceu.
Admirado por voltar a ver tudo o que desejou desde criança, sorriu… como não sorria há anos. E com uma força que não sabia ter, desejou aquele mundo novamente.
Foi esse desejo que parou o vento, o frio e as lágrimas e o encheu novamente de vida. E com esse sentimento veio a consciência dos seus erros, egoísmos e indiferença perante a Vida que lhe tinha sido dada por alguém especial para ele.

Com o coração curado e sentido uma nova vida dentro de si, sentou-se e olhando para o céu disse: “Obrigado!” - a última coisa que disse antes de desaparecer para o mundo que viu reflexo.
Délio Melo quarta-feira, agosto 29, 2007 | 0 comments |

quarta-feira, agosto 15, 2007

Sempre

Na minha rua passam carros a toda a hora – de um lado para o outro, daqui para ali…
Há minha frente está um grande prédio que me tapa muita da vista que tinha antes de vir para aqui morar.

Pode parecer estranho mas ao olhar para fora de casa, sentado na varanda, parece que fui de férias para um lugar “esquisito”… e estou aqui há quanto tempo? 10 anos?
Talvez este sítio não seja o melhor para mim. Secalhar eu é que sou o organismo estranho no sistema. Mas há algo de especial aqui também. Ao olhar para a esquerda há um pequeno grupo de prédios que parecem estar sempre na mesma, como se tivessem sido deixados ao (ao tempo). Não são bonitos, têm algo no seu desenho como conjunto que os tornam especiais (como uma memória antiga ou um sonho quase real que nos levou para cantos que simplesmente não existem neste mundo acordado). E logo por trás, um conjunto de montes que transpira ainda mais acalmia do que o outro.

Se olhar para um não consigo atingir a beleza do seu cenário, é quando os vejo simultaneamente que pareço ver algo mais.
Como é que duas imagens tão distantes, tão distintas, parecem agora tão próximas, tão ligadas… tão “necessárias”?

Porque é que só consigo descobrir este lugar às vezes? E tantas mais perguntas me passam agora pela cabeça...
Délio Melo quarta-feira, agosto 15, 2007 | 0 comments |
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